Vamos todos tomar caju!

Artigo de Liana John, publicado no Blog Biodioversa, do Planeta sustentável, em 21/06/2012 
Amarelo crepúsculo não é cor do sorriso da mocinha da saga literário-cinematográfica ao dizer para o lobisomem que prefere o vampiro. Não. Amarelo crepúsculo é um corante amarelo alaranjado produzido a partir de hidrocarbonetos aromáticos derivados de petróleo. Costuma ser adicionado a refrigerantes, bebidas isotônicas, geleias, doces de frutas, misturas prontas para refrescos ou sopas, margarinas, preparados para gelatinas de frutas cítricas, farofas, salgadinhos, macarrão instantâneo, sorvetes, comprimidos farmacêuticos e medicamentos infantis. Boa parte dos produtos industrializados com cores artificiais em amarelo, laranja ou vermelho tem sua dose de amarelo crepúsculo.
Nos países com legislação mais rigorosa, o uso do amarelo crepúsculo é proibido, devido à possibilidade de causar alergias e por conter, frequentemente, o corante Sudan I como impureza, considerado carcinogênico (causador de câncer). Mas no Brasil ainda é largamente utilizado. Pelo menos enquanto não entra no mercado o corante amarelo alaranjado natural, produzido a partir do bagaço de caju (Anacardium occidentale).
A boa notícia é que o processo de produção já tem patente depositada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em conjunto com oCentre de Coopération Internationale en Recherche Agronomique pour le Développement (Cirad), o Centre International d’Études Supérieures en Sciences Agronomiques (Montpellier SupAgro), ambos da França, e a empresa cearense Sabor Tropical. E a intenção é começar a produzir o novo corante ainda em 2012.
Com a pesquisa, o engenheiro de alimentos Fernando Antonio Pinto de Abreu, da Embrapa Agroindústria Tropical, obteve o título de doutor em Engenharia de Processos. E o consumidor brasileiro agora tem a chance de trocar a tinta sintética por um corante com carotenoides, substâncias que nosso organismo transforma em vitamina A, também chamadas de pró-vitaminas.
“O corante natural à base de caju é de um amarelo clarificado, como a cajuína, diferente daqueles produzidos à base de urucum, por exemplo. Ele substitui químicos banidos nos Estados Unidos e na Europa e ainda utilizados aqui”, comenta Fernando Abreu. “E a extração do corante é feita a partir do bagaço do pedúnculo de caju, ou seja, é um produto fabricado a partir do que hoje é considerado resíduo pela indústria de sucos”. Segundo o engenheiro, a indústria terá de repensar sua linha de produção, redirecionando o bagaço de caju para a extração do corante, de modo a se beneficiar do valor agregado.
A pesquisa se insere num grande projeto de estudo de frutas apoiado pela Comunidade Europeia e realizado em cinco países da América Latina. No Brasil, a maior parte dos recursos veio da própria Embrapa e Fernando Abreu contou com apoio da colega Lourdes Cabral. Nos dois institutos de pesquisas franceses, o pesquisador conheceu as tecnologias de microfiltragem e diafiltração, que usam membranas para concentrar os elementos desejáveis e eliminar os indesejáveis. Seu trabalho foi desenvolver um processo com estas tecnologias para o bagaço de caju, que foi o objeto da patente.
Já “a participação da empresa privada nos permitiu fazer testes e avaliações em escala maior que a laboratorial, comprovando a viabilidade e o potencial da tecnologia para o mercado”, acrescenta Abreu. Ele conta que o engenheiro mecânico Fernando Furlani herdou a Sabor Tropical do pai e resolveu apostar em novas tecnologias e novos produtos, além de manter a produção de cajuína orgânica (suco clarificado de caju). Agora, para tal parceria ganhar “o mundo” falta apenas concluir uma fase de testes toxicológicos, prevista para o segundo semestre.
“Depois disso, continuaremos estudando 11 das moléculas contidas no extrato de caju, de alto interesse comercial”, observa. Conforme acredita Fernando Abreu, é possível separar essas moléculas e fabricar, por exemplo, cápsulas de pró-vitamina A para uso como suplemento alimentar.
Por uma via ou por outra, bom mesmo é ter a alternativa de trocar o químico à base de petróleo pelo corante natural à base de biodiversidade brasileira. Assim, convido a todos para tomar caju!

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